Banda Devassa - Rio de Janeiro. (Cultura, Esporte e Lazer).
"RENDEZ-VOUS COM PAPAI NOEL"
(Crônica de Natal - Dezembro/2012).
Poderia ter usado a verdadeira tradução em nosso vernáculo dessa expressão francesa para intitular esta crônica. Contudo, nesta época de vários tons de cinza, nada como também usar de uma artimanha editorial para fisgar leitores incautos.
Fica assim combinado: foi um simples encontro cordial com o velhinho, neste caso um simpático Papai Noel. Não se trata de ficção. Encontrei-me efetivamente com ele, o mesmo que, neste fim de ano, bate ponto no Shopping da Praia da Costa e nos seus comerciais televisivos.
Saí caminhando por Itapoã de dentro, abandonando o calçadão "sur la plage" por causa do causticante sol. Coloquei o meu "panamá" e fui-me protegendo nas sombras dos grandes prédios, trocando de calçadas para evitar passar rente aos "febris labores" da construção civil. “Cuidado, queda de materiais !!!!”
Cheguei ao shopping, onde não poderia achar nada melhor para completar minha caminhada no ambiente refrigerado e sob a proteção solar dessa "catedral de consumo", principalmente privilegiada em épocas natalinas.
Lá na praça central construíram uma cidade de fadas para a diversão das crianças, embaixo de uma linda decoração que descia do alto teto e ao lado da imensa árvore de Natal, também lindamente enfeitada e iluminada.
Na entrada da cidade de brinquedos, sentado em sua cadeira episcopal, estava um Papai Noel de longas barbas naturais branquinhas e espessas, muito bem cultivadas e cuidadas, lindas, muito bem vestido em enchimentos que o fazia ganhar uns quilos, a conversar com uma linda menininha sentada numa de suas pernas. Parei para admirar a cena. O papo rolava alto. Admirei-me, principalmente, porque as crianças geralmente temem o bom velhinho, ficam olhando de soslaio, às vezes chegam às lágrimas querendo logo o colo do papai verdadeiro ou da mamãe protetora.
Mas nesse caso não. Conversavam à larga. Eu imaginei o Papai Noel pregando as boas ações para a menina: respeitar os mais velhos, papar tudo, não brigar com os amiguinhos e caprichar na escola. A menina correspondia aos conselhos do velho senhor, pensando, provavelmente, no presente que iria pedir e já imaginava recebê-lo logo, se possível, sem esperar a grande data do périplo aéreo na carruagem puxada pelas renas voadoras.
Nisso, o gaiato de um funcionário do local, vendo-me parado a observar aquela cena, convidou-me a conversar também com o Papai Noel, possivelmente porque eu também uso uma barba branca não tão vistosa quanto à do personagem encarnado. Respondi que daria uma volta e retornaria para o encontro.
Continuei sem mais pensar no acontecido e vaguei pelos andares ainda sem grande freguesia no início dos trabalhos daquele dia. Subi até a livraria e somente entrei porque estava sem dinheiro e sem cartão de crédito. Caso contrário seria tentado a comprar algum livro, mesmo nesta estação de grandes best sellers de qualidade duvidosa e cheio daquelas gôndolas com belas edições de capas pretas com os crepusculares romances que frequentam as listas dos blockbusters. Coisas desta modernosa modernidade!
Quando voltei ao térreo, Papai Noel estava disponível. Lembrei-me da promessa, e o mesmo funcionário me abriu prontamente o cordão de isolamento que dava acesso àquela notória personalidade. Entrei. Fui recebido efusivamente por um Papai Noel que se levantou de sua imponente cadeira e veio ao meu encontro. Cumprimentou-me com um aperto de mão e, em pé, encetamos num rápido papo, sem que ele me largasse a mão.
>>> Vim parabenizá-lo pela caracterização. Com essa barba natural branquinha você me faz acreditar piamente em Papai Noel. Nunca tinha visto um Papai Noel tão convincente, tão verdadeiro como agora.
>>> Pois bem: Papai Noel existe (respondeu-me). Você nunca deveria ter dúvidas quanto a isso. Como existe o espírito de Natal que representa a amizade, a compreensão, a esperança de farturo que sempre desejamos, e a vontade de partilhá-la com os filhos, parentes e amigos. Enfim, com todas as pessoas. Esse sentimento de ser bom, alegre e de amar o próximo.
Foi mais ou menos isso que ele me transmitiu. Depois entrou por um papo religioso que eu estranhei partindo de uma entidade laica, apesar de ter suas origens nas festas natalinas e nas ações de um bispo católico – "São Nicolas". Figura "laica" porque hoje foi completamente abduzido pelo consumismo. Não o bispo, mas o "Noel". Continuou pregando e terminou essa parte me perguntando se eu acreditava em Jesus Deus. Eu incontinenti respondi afirmativamente. Como poderia ser de outra maneira diante de uma "autoridade eclética" e eclesiástica, haja vista as suas perorações e os conselhos que ainda viriam.
Essa mistura laica e religiosa, natural, pois o Papai Noel se confunde com o Natal, quando se comemora o nascimento do Cristo, às vezes embaralha as mentes infantis levando-as a confundirem o "coelhinho da Páscoa" com o "Menino Jesus" e com o "velho Noel".
Não obstante, nada contra aquelas declarações. Faz parte das ilusões do Natal. Antes de nos despedirmos aconselhou-me a submeter-me sempre aos meus exames médicos periódicos, principalmente a consultar o urologista. Ele me confessou que assim procedia regularmente porque já completara sessenta anos. Fiquei perplexo com a juventude e a jovialidade dele, diante de um macróbio de setenta e três anos.
Agradeci muito e saí sorridente. Pela primeira vez em minha já extensa vida tinha tido um papo cara a cara com aquele senhor mitológico que sempre me impressionou e povoou meus sonhos na primeira infância. E que nunca me deu uma bicicleta.
Esse encontro me lembra, sei lá por quê, de quando encontrei numa festa na casa de um amigo uma escritora e acadêmica e confessei a ela que era a primeira vez que tinha o prazer de cumprimentar uma pessoa "imortal".
Voltando para casa, contei a história ao motorista de táxi (voltei de táxi para me resguardar do sol), depois à minha mulher quando cheguei a casa e mais a quem encontrei desde então. Acho que ainda tenho tempo para repassar para os meus leitores esta aventura, antes do dia 25, desejando a todos a ilusão, a fantasia e o sonho que sempre se renovam e se inserem nos votos de Feliz Natal e de Próspero Ano Novo.
(Genserico Encarnação Júnior).
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